
O burguês, que assiste bestificado o trabalho do outros, não mostra possuir consciência do estado em que se encontra. Ao realizar os mesmos caminhos daqueles que o precederam e dos que ele precede, não parece estar preocupado com as escolhas que lhe são impostas. Instrumento de uma Racionalidade prática, incapaz de traçar o próprio caminho, sente-se feliz. Ocorre, no entanto, que essa felicidade aparente é, como tudo o que possui, comprada, indicada, recomendada pela coletividade em que se inseriu ao sentir aquela “inevitável necessidade de também ser fera”. No caso do operário a situação não parece andar diferente. Estando também servindo a uma lógica instrumental, na condição de mais um instrumento, o indivíduo parece ignorar o estado de dominação que o abate, ou os estados de dominação, quais sejam: a relação com o patrão, e a relação com uma sociedade instrumentalizada, com uma racionalidade que visa a fins instantâneos (de prazer?), como forma de reprodução do ideal capitalista, superior ao indivíduo. Como se vê, a única coisa que parece diferenciar os dois grupos é o poderio financeiro que cada um possui para comprar sua dose de entusiasmo, de felicidade forjada.
Trata-se do apagamento da esfera individual, na atual sociedade todos sentem – dominadores e dominados, na terminologia Marxista – o mesmo impulso a bestificar-se (assim nos lembra Augusto dos Anjos). Desaparece o poder de escolha, dissolve-se o EU em nome de um NÓS que rapidamente é ELE, ao qual todos se devem unir. “ELE”, aqui, representado por qualquer instância responsável por diluir, na prerrogativa do convencionalismo e da instituição como regra, o poder de escolha daquele EU.
Duas são as questões a se discutir. A primeira é quanto à necessidade de um questionamento íntimo, um pensar verdadeiramente transgressor, transcendente, emancipador, mas, sobre isso falo no último parágrafo. O segundo é justamente o que diz respeito à capacidade das convenções, dos papéis sociais, de minar a opção pessoal. Na contramão dessa tendência, é bastante atraente a figura de “Mersault”, o herói absurdo do romance O Estrangeiro de Albert Camus. Diante da sociedade contemporânea e de seus ícones, o jovem parece abster-se à necessidade incessante de escolher, de ser também fera, de aliar-se a essa ou aquela regra social. Não é alienação, mas raciocínio crítico, crença na própria capacidade de pensar o mundo e a vida.
Pensar! Essa talvez seja a resposta. O questionamento interior, aquela “extenuante pergunta íntima”. Mas é difícil se questionar. Eu disse certa vez, aqui mesmo: "Cada nova exigência de concentração é um passo rumo à completa incapacidade em se concentrar". Eis a crise real. E o pensamento como práxis política passa a ser mais uma utopia de um mundo de utopias. Quando não são utopias, são conclusões dadas, não menos prejudiciais. E por esse motivo Álvaro de Campos se revolta: “Não! Não quero nada! / Já disse que não quero nada / Não me venham com conclusões / A única conclusão é morrer” (Lisbon Revisited, 1923). Morrer ou Raciocinar, aquilo que mais convier aos corações enfurecidos e não submetidos, ainda, aos desmandos coletivos. Se o José, de Drummond, pudesse ver dessa maneira, gritaria, gemeria, tocaria, dormiria, cansaria e, enfim, morreria bem; “Mas você não morre, / Você é duro José”. Quanta falta te faz um bom papo de esquina com Mersault. Não para ser como ele, pois que não te faria sentido, mas para ver que “tanto faz” é revolta. Muitas vezes a revolta do possível, a livre, a real exaltação do EU.
Trata-se do apagamento da esfera individual, na atual sociedade todos sentem – dominadores e dominados, na terminologia Marxista – o mesmo impulso a bestificar-se (assim nos lembra Augusto dos Anjos). Desaparece o poder de escolha, dissolve-se o EU em nome de um NÓS que rapidamente é ELE, ao qual todos se devem unir. “ELE”, aqui, representado por qualquer instância responsável por diluir, na prerrogativa do convencionalismo e da instituição como regra, o poder de escolha daquele EU.
Duas são as questões a se discutir. A primeira é quanto à necessidade de um questionamento íntimo, um pensar verdadeiramente transgressor, transcendente, emancipador, mas, sobre isso falo no último parágrafo. O segundo é justamente o que diz respeito à capacidade das convenções, dos papéis sociais, de minar a opção pessoal. Na contramão dessa tendência, é bastante atraente a figura de “Mersault”, o herói absurdo do romance O Estrangeiro de Albert Camus. Diante da sociedade contemporânea e de seus ícones, o jovem parece abster-se à necessidade incessante de escolher, de ser também fera, de aliar-se a essa ou aquela regra social. Não é alienação, mas raciocínio crítico, crença na própria capacidade de pensar o mundo e a vida.
Pensar! Essa talvez seja a resposta. O questionamento interior, aquela “extenuante pergunta íntima”. Mas é difícil se questionar. Eu disse certa vez, aqui mesmo: "Cada nova exigência de concentração é um passo rumo à completa incapacidade em se concentrar". Eis a crise real. E o pensamento como práxis política passa a ser mais uma utopia de um mundo de utopias. Quando não são utopias, são conclusões dadas, não menos prejudiciais. E por esse motivo Álvaro de Campos se revolta: “Não! Não quero nada! / Já disse que não quero nada / Não me venham com conclusões / A única conclusão é morrer” (Lisbon Revisited, 1923). Morrer ou Raciocinar, aquilo que mais convier aos corações enfurecidos e não submetidos, ainda, aos desmandos coletivos. Se o José, de Drummond, pudesse ver dessa maneira, gritaria, gemeria, tocaria, dormiria, cansaria e, enfim, morreria bem; “Mas você não morre, / Você é duro José”. Quanta falta te faz um bom papo de esquina com Mersault. Não para ser como ele, pois que não te faria sentido, mas para ver que “tanto faz” é revolta. Muitas vezes a revolta do possível, a livre, a real exaltação do EU.