terça-feira, 25 de dezembro de 2007

Desassossego

Este texto é impublicável, uma ofensa, qualquer coisa, não há flores para homenageá-lo. A sua ausência de nexo explica-se. Mas não é o autor quem fará isso. Seu autor é a tal ponto incoerente que ele (o texto) tende a afastar-se. A miséria assola o escrito e o escritor. Ambos parecem ter o mesmo destino traçado. Um sofre pela ausência da lógica extra corpórea, pela derrocada de um mundo que nunca teve padrões, mas pareceu confortável por algum tempo. O outro sofre da falência do primeiro, que nasceu falido e descobriu-se assim no meio da vida. O escritor falseia, a mão vacila e nasce uma "história nenhuma". Que é a vida senão uma "história nenhuma"? A superação de um "não ser nada" posto acordado lá pelo meio da própria vivência? Quando se descobre que a vida faz menos sentido do que deveria, resta andar de mãos dadas, com outro sonhador menos empolgado, mas ainda lúcido. Este texto é imperdoável. Sua paciência esgota-se e ele (o texto) ainda caminha torto. A culpa jamais foi do escritor, ou do escrito. A culpa é querer-se dar coerência à mais absurda criação: a vida. Nessas horas vale algo ser culpado e criminoso, faz da vida uma aventura anti-leis, os "desvarios". Que é a lei senão "desvarios coletivos". E é assim loucos que negamos a loucura alheia. Perdoem por favor o artista, ele já bebeu a mesma insanidade do mundo. Nesse momento, o autor do texto já não pensa. A mão corre pelas teclas, a cabeça (perdida de há muito) dá os primeiros sinais de não saber exatamente o que fazer com a vida e as leis. Ela é como o texto, incoerente. Mas o que é a incoerência senão "vida" e "leis"? E que lei absurda é essa que nos garante, ao nascer, a certeza de que não poderemos viver para sempre? Esse texto é impugnável. Não deseja nada além da chance de existir. Como uma nova vida, num mundo de não-vidas. Não há o que refutar pois que não há regras. As leis se foram junto ao menor tino. É estranho: são loucas e lúcidas as leis, como é a vida, e a morte. Na verdade, se resta algo a dizer, o autor gostaria de não dizer nada. Não há palavras diante do absurdo. Diante dele abrimos a boca, pasmos, e desejamos não fazer parte da cadeia de incoerências que se chama "lei", a vida. Mas o texto luta ainda. Mais uma linha, ou duas. Tudo bem, não há regras. E de "não-ditos" já estamos lotados, que são mais alguns? E continuem plantando flores. Elas serão úteis quando menos se quiser esperar.

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Metade arrancada de mim.

– Acabou. Eu tinha certeza de que não iria sobrar nada depois do primeiro beijo. Acabou. Só me esforcei para confirmar o que eu já sabia. A verdade é que eu não te amo. Nunca amei, mas isso você sabe... Bem... Eu sempre te disse, não foi?
– Sim. Mas...
– Era só desejo!
– Desejo?
– É. Desejo de provar pra mim mesmo que... Você sabe que eu sou egoísta. Queria provar pra mim que ainda não tinha perdido o jeito. Mas não vai além disso. Eu deveria ir mais um pouco. Te levar pra cama. Mas é perda de tempo. Eu já consegui. Não vou precisar chover no molhado. Te levar pra cama ou não, tanto faz. Mas levaria se eu quisesse.
– Mas e se "eu" quisesse?
– É claro que você quer. Por isso eu não preciso continuar, já te conquistei. E agora vem aquela coisa de jogar fora. Não é verdade. Não se joga fora o que não se tem. Eu não tenho você. Nem quero. Eu queria que você me desejasse, só pra me sentir bem. Enfim, não vou ficar aqui te magoando. Preciso resolver umas coisas.
– Mas você não está me magoando.
– Tá vendo. É por isso que ninguém te valoriza. É por isso que eu não te valorizo. Se eu dissesse que era pra comer minha bosta você comeria.
– É porque eu gosto de você, porra! E...
– Eu já sei que você gosta, esse é o motivo de eu não precisar mais de você. E não aumente o tom de voz. Eu não suporto histeria. Já me convenci de que ainda posso, de que ainda faço o que tenho vontade. E ponho quem eu quiser pra comer na minha mão. Todo mundo fala lá no restaurante que você é o prato principal, o melhor, o que todo mundo quer mais ninguém tem. Grande merda. Agora tá aí. Pedindo pra ser embrulhado e levado pra casa. Credo. Não sei o que é pior: a sua cara de cão-sem-dono ou essa metáfora!
Eu poderia fazer você sair dessa vida medíocre. Eu poderia te fazer acreditar no amor. No fundo é isso. Eu te amo. Mas você tem medo de...
– Você quer mesmo que eu continue conversando? Porque se quer, pára de falar besteira. Quer saber, já enjoei. Vou dar o fora daqui antes que você me peça em casamento e me prometa roupa lavada. Quanta idiotice. E fala pra sua mãe passar lá no restaurante pra pegar suas coisas, porque se eu tiver que olhar pra essa sua cara de novo, é capaz de eu não conseguir trabalhar. Aliás, muda essa sua cara, pelo amor de Deus. Ninguém mais acredita em homem bonzinho. Tchau Pedro, dá um beijo aqui.
– Lúcia, você é uma puta completa.
– Benzinho... Pense nessas últimas semanas. Você vai ver que a puta aqui era outra pessoa.
– Sua idiota. Você sabe que eu não ligo.
– Liga sim... Aliás, não me ligue, não. Por favor.

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Image Hosted by ImageShack.usLerdo, após várias decepções com uma Vanzinha Paulista, anda meio amargo. É provável que essa história tenha se dado com personagens invertidos. Mas só ele viu. O negócio é acreditar no que o nosso furgãozinho diz.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Ilusão (Ato I, Cena I).

Abrem-se as cortinas, música alta tocando - sala típica (poltronas e carpete - os personagens andarão ao redor, mas não sentarão).

Júlio (entrando pela direita, conversando sem olhar para trás, a música vai baixando, aos poucos, a voz ficando mais perceptível)

"Não é tão simples quanto parece. (entra Sérgio pela mesma lateral) Fazer cinema é caro, é preciso captar muito dinheiro, convencer pessoas de que sua idéia é melhor que as duzentas outras idéias que elas recebem todo dia".

Sérgio (entrando e colocando-se a dois metros de Júlio)

"O Governo costuma ajudar, todo filme tem o patrocínio da Petrobras e da Anvisa".

Júlio (entre gargalhadas)

"É Ancine seu idiota! Anvisa é de Vigilância Sanitária! Acho que nem se fosse um filme de merda como o nosso, a gente ia ter patrocínio da Anvisa! Hahaha!. (Sérgio começa a rir). Tá vendo Sérgio? Se você não melhorar seu discurso a gente não consegue patrocínio nem com o Zé da desentupidora".

Sérgio (esfregando o rosto, como tentando se recompor)

"Ai... é tudo a mesma coisa. Ancine, Anvisa, Angina... O que a gente precisa é de indicação. E se a gente escrevesse um email? Sei lá... Pro Fernando Meireles? Aquela produtora dele é cheia de ajudar iniciante. Ele tem um blog, lá deve ter os meios de contato".

Júlio (olhando para um ponto futuro, pensativo)

"A idéia não é má! Mas será que ele lê tudo que escrevem? Geralmente esses caras têm assessor até pra cagar!". Tudo bem. Vamos ver a Ana antes, ver o que ela acha disso, daí a gente vai jantar e manda esse email amanhã. Na janta, a gente pensa no que vai escrever. Você acha que vale a pena mandar uma cópia do Roteiro? Antes de registrá-lo?

Sérgio

"Melhor não. Vai que esse email cai em mãos erradas e roubam nosso negócio".

Júlio (Saindo por onde entrou, Sérgio vai na frente - Volta a música, agora bem alta , mal se ouve o que o Júlio diz)

"Certo. A gente combina uma reunião, se ele responder, é claro". (Sai)

Ato I, Cena II
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Image Hosted by ImageShack.usLerdo esteve um tempo em São Paulo. Lá, conheceu dois rapazes muito estranhos, Sérgio e Júlio. A história deles parece engraçada de se contar. Além disso, pôde voltar a Marília e bater um papo com o Vinicius, um rapaz que só pensa em Sexo, Rosquinhas e Rock and Roll.

domingo, 9 de dezembro de 2007

Déjà vu!

Os movimentos cíclicos da mídia visual ficam mais perceptíveis quando o fim de ano se aproxima. O mesmo raciocínio vale até o carnaval. Não parece haver qualquer relação cósmica com a adoção do horário de verão, mas poderia. No período entre novembro e março, a televisão assume postura típica à do jovem contemporâneo que ela ajuda a "emburrecer", ou seja, "copiar e colar". Nesse sentido, fica impossível criticar nossos estudantes que "criam(?)" conhecimento a partir de uma séria de reproduções dos discursos alheios - muitas vezes imprecisos, falhos, incoerentes - encontrados através da internet. Nos produtos televisivos, dá-se algo parecido; os programas de variedades, os esportivos, as telenovelas deflagram um processo de repetição dos mesmo conteúdos, com a diferença de que aqui, cada passo na mimese é pensado nos detalhes, algo que estudantes menos experientes ainda não aprenderam a fazer.

Um exemplo clássico, cansativo pois infame, são as reportagens relativas ao desespero de jovens próximos ao vestibular. Todos os anos consultam-se psicólogos, professores, nutricionistas, que acabam versando sobre os mesmo assuntos: "não estude na véspera", "beba água e coma coisas leves", "procure pensar em coisas positivas". Vou gravar uma reportagem dessas e passar para os meus alunos. Mas a esperança de que eles aprendam algo vai se diluir quando aparecer o primeiro "ponto material que viaja no vácuo com velocidade uniformemente acelerada"!

Também são comuns as discussões acerca do trabalho alternativo, dos contratos trimestrais que as empresas assinam para suprir a maior carga demandada no período de festas. Todo fim de ano descobriremos que o dono da montadora de veículos venderá 30% a mais no natal. Todo ano veremos que ele precisará de 30 novos colaboradores. Todo ano saberemos que o sonho desses colaboradores é ser efetivado no cargo. Todo ano veremos o desemprego subir novamente em janeiro, após uma falso período de economia aquecida - inclusive com ajuda da velhinha que coleciona bonecos de papai noel, ou da costureira que descobriu um jeito bonitinho de fazer árvores de natal com retalhos coloridos, e pode aumentar a renda da família nesse fim de ano!

No entanto, o que mais me incomoda ainda são as reportagens do Globo Esporte sobre os casos-exemplo de superação que disputarão a Corrida de São Silvestre no último dia do ano. Não há valor didático ou informativo em saber que um senhor tentará completar a prova após ter tido quatro derrames (e os 30 anos bebendo e fumando são agora esquecidos). Não há utilidade em descobrir que um ex-catador de lixo agora tem uma condição minimamente mais justa graças ao esporte - porque as oportunidades não são para todos. Não se deve dar a essas pessoas a responsabilidade de exemplificar o brasileiro médio, batalhador, esperançoso. Esse trabalho deveria justamente partir dos donos do poder, eles sim são responsáveis. São os culpados por organizar um mundo sem valores (em que o álcool vira fuga). Culpados por não dar oportunidades dignas para se praticar esporte a todos os cidadãos. Culpados por construir uma sociedade em que catar lixo é um exemplo decadente da dissolução do gênero humano, quando não é corretamente informado e construído.

Dito assim, seria de se supor que o mais correto é repetir as mesmas reportagens, pois não faria diferença nenhuma. Por que não reprisar as mesmas entrevistas citadas acima todos os anos? Afinal, são todas iguais. De fato seria mais honesto. Porém, numa sociedade de consumo deturpada, em que a "massa" já se contaminou, e da qual é praticamente impossível se libertar, as pessoas não ligam em ser enganadas. Querem apenas um mínimo de sensação de conforto, ainda que forjada pelos dominantes como forma de controle. Não ligam em ser enganados, e, caso fossem obrigados a assistir à mesma cena todo fim de ano, talvez até se revoltariam. "Porque eles podem me enganar, doutor! Desde que eu não perceba".

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Celebridades via Web 2,0

Os blogueiros Frederico e Rodrigo do Jacaré Banguela acabam de produzir um excelente documentário sobre a influência da Internet na criação de celebridades instantâneas. Ótimas entrevistas com Sociólogos, Blogueiros e novos famosos ajudam a contar um pouco sobre o sucesso estrondoso e peculiar produzido pela Web 2.0. São ótimos 25 minutos que valem muito a pena serem vistos. Uma chance de conhecer os meandros do meio de comunicação mais "democrático" da história. Para assistir, clique aqui, ou na imagem abaixo:

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