domingo, 13 de janeiro de 2008

Desfazer-se

O escritor é um ser carnal. Pode haver, é claro, momentos de incrível inspiração, mas é humano. E sendo assim, hora ou outra volta-lhe a necessidade mais que natural de sentir o normal dos homens, sentir-se apenas. O escritor torna-se incapaz de fugir de si mesmo, de sua literariedade, para voltar a ser aquele indivíduo que aporta o mundo com a obrigação única de deixá-lo. E quando assim ocorre, percebe que sua incapacidade está ligada não ao estilo que adotou, mas ao medo do comum, do simples, do apenas. Esse medo, é bom que se diga, torna-o superficial nas conclusões, no falar, no agir, pois adota para si uma postura anti-natural. Sentado em um mesa de bar, discutindo futebol, o escritor desenterra arte, pseudo-arte. É incapaz de argumentar ordinariamente. Está contaminado. Triste escritor que está doente.

Sendo assim, ao ler o que escrevem os seres de carne e osso (melhores portanto, pois têm vida), o escritor se desespera. Serei eu capaz de um pensar fluido assim? É possível escrever ainda como em uma conversa informal de amigos, de familiares, e ainda assim dizer tudo o que deve ser dito? Serei capaz da simplicidade? É provável que não. Pois todas essas minhas indagações, se eu não fosse escritor contaminado, seria resumidas de um modo muito mais belo: "eu queria fazer assim também"! Mas não consigo, ou melhor "a capacidade do singelo me abandonou pelos desvios". Pseudo-literariedade, pseudo-vida. Triste escritor que não vive.

Percebe-se claramente que o que se discute é a dicotomia existente entre "simples" e "literário". O que não parece óbvio é que os seres amam a maneira de dizer do escritor, mas não sabem que o escritor já se cansou, e prefere o comum, pois o comum é a seu modo a mais literária forma de agir, de pensar, de escrever, enfim. Mas só ele não consegue fazê-lo e vai olhar para aquela simplicidade que desenterra de si e dizer que é falsa, não é a simplicidade natural dos homens, aquela que deixa os corações e mentes sadios e nos brinda com o cotidiano de quem vive, vida de verdade, escrita de verdade. Triste escritor que não escreve.

Então, quando não há o que fazer, e o escritor morre por dentro ao ver amigos cada vez mais simples e cada vez melhores, escreve uma crônica que não é simples, pois não sabe ser. Os amigos dirão que ele está louco, que seu estilo é único e libertário. Lúdico! Onírico! Maravilha e arte. E se assim não disserem é porque são simples. Talvez repitam "Muito Bom Escritor" e serão lindos! Só o escritor não é. Porque só consegue ver no que diz as artimanhas que a vida lhe incutiu, os joguetes de beleza falaciosa, de teatro de escrever. O escritor é triste sim. Diz as coisas desdizendo. Triste escritor que não é simples.

Dito de outra forma.

7 Resposta(s):

Anônimo disse...

tua peça não sai mais, sr. agonia? :)

Desafinada; disse...

"a capacidade do singelo me abandonou pelos desvios".
Devo estar contaminada.

Discutindo Espiritismo disse...

eu entendi tudo o que você quis dizer [pelo menos isso. eu com a minha lerdeza...] mas você sabe muito bem que eu não concordo. e que apesar de ter feito um post lindo - pra variar - desta vez, eu ganhei a discussão!
hahahaha...

ah, zé, você é ótimo!
beijo.

poeta sórdido disse...

conhecê-lo, se ele tiver poder de sedução suficiente;

sinceramente, acho que não faz parte das minhas predileções. tenho meus ransos com o já consagrado.

teorize mais sobre essas doenças psicosomáticas do escritor, ok?

Anônimo disse...

Escritor, só se for português-perfeito, bunda mole.
Vá levantar uma parede.
Todo escritor, é um grande filho da puta, neste caso, o grande filho da puta se aplica também aos semi.

Anônimo disse...

Escritor, só se for português-perfeito, bunda mole.
Vá levantar uma parede.
Todo escritor, é um grande filho da puta, neste caso, o grande filho da puta se aplica também aos semi.

Carol Almeida disse...

Triste o escritor que não vive, sim, porque cala as vozes das tantas personagens que nele vivem...

Um abraço.

Clicky Web Analytics